Lucília com 2 anos e 7 meses:
– Mamãe, vamos fazer casa igual o papai?
– Eu não sei, Lucília.
– Por quê?
– Não estudei na escola que seu pai estudou?
– É?
– Seu pai é engenheiro. Ele faz casa, sua mãe não é engenheira.
– Só homem que faz casa, não é? (ela andava observando muitas construções)
– Não. Mulher também faz. Mulher que é engenheira.
– É?
– É.
Não se sabe exatamente quando, mas em algum momento a partir do ano de 1960 minha avó transcreve essa conversa que teve com minha tia Lu, como é carinhosamente chamada. Não parti dela, e nem sequer me lembro precisamente quando encontrei ou me foi dado o conjunto de páginas intituladas “notas sobre meus filhos”, mas acredito, hoje, que o encontro com este relato tenha sido o alicerce de toda minha pesquisa a respeito da Jacy. Parto dela para, junto com a minha avó, tentar responder: quem constrói as casas? Quem são, também, as engenheiras?
A casa é o que o sujeito faz dela. Um lugar que abriga devaneios, onde se é possível sonhar em paz; cuja existência está mais nos afetos e nas estórias, que no rígido concreto. Uma casa que se transforma, fluida, tal como a memória. Depaupera-se, perde o viço, mas permanece viva porquanto haja imaginação, porquanto haja estórias e quem as possa contar.
A casa da minha infância, foi construída pelo meu avô, Ruy, e pela minha avó Jacy, uma mulher nascida em mil novecentos e trinta, mãe de quatro filhos, doutora em Sociologia da educação, professora na Universidade Federal de Minas Gerais e autora de um material didático que, após romper com um conservadorismo que via algo de muito inovador em seu conteúdo, foi usado em quase todo o Brasil. Tanto em casa, quanto na sala de aula ela passou a vida ensinando a ouvir, contar e criar histórias.