“Rios em flor” é um livro de poesia visual. Traz imagens em preto e branco, feitas entre 2011 e 2021, além de textos de Helena Rios e de Leo Divendal, artista e professor holandês. Durante os anos em que esse trabalho foi sendo construído, com mais ou menos consciência do que eu queria, fui colecionando imagens que traziam experiências de transformação. Em um certo momento eu tinha a água como elemento principal para simbolizar essas mudanças – as águas congeladas, as águas fluidas, as brumas. Depois fui incorporando outros elementos, outros símbolos, de libertação, de revelação… os pássaros, os seres que estão ocultos e depois se mostram, as janelas. E fui percebendo que a personagem (uma menina) que desde o começo conduzia a história era em si o símbolo mais forte das transformações que o livro mostrava. Se mais conscientemente eu buscava imagens que representassem essa transformação (com outros elementos, como a água), depois percebi que era exatamente ao fotografar essa personagem que essa transformação mais aparecia. Este livro é sobre a potência de transformação, sobre a capacidade de se metamorfosear, de renascer. Sobre a capacidade de voltar a florir. O texto que acompanha as imagens propõe uma conversa com uma menina fictícia chamada Lírio: “Vem sentar-te comigo, Lírio, a sentir o chão, a ver a beleza das flores e experimentar a força da terra.
Vem ouvir sobre teu encanto e conhecer a história de tua chegada neste campo. Tu sabes, Lírio, com qual potência e com qual energia vieste? Eram duas irmãs. Foi no ventre da primeira delas que começou a germinar teu corpo de menina. Mas aconteceu que, como se refletida por um espelho, puseste a te movimentar, também, no corpo da segunda mulher. Era esse um corpo desinteressado de vida, corpo de bicho empalhado. Era carne sem cabimento de frutos. E, enquanto crescias no corpo de tua mãe, espelhava-te e fazia raízes nesse corpo adormecido. Teu germe, refletido, rasgava o miolo seco buscando qualquer água que fosse. Cortava os tecidos, abria caminhos no tronco há tanto sem espaços de vida. (…)”